O movimento unicista ensina que o batismo nas águas dever ser ministrado na fórmula mágica de Mateus 28.19. Segundo David K. Bernard, a gramática do texto hebraico denota um nome singular. Sendo que Jesus é ao mesmo tempo Pai, Filho e Espírito Santo, e sendo que Ele veio em nome do Pai e enviou seu Espírito em seu nome, o único de Mateus 28.19 tem que ser Jesus. A igreja primitiva, que incluía Mateus, cumpriu as instruções de Cristo, batizando em nome de Jesus. Bernard explica que devido a uma intensa perseguição movida pela Igreja Católica, o batismo em nome de Jesus foi substituído pelo batismo pagão em nome da Trindade.
Embora não exista consenso quanto a data exata do reaparecimento do unicismo no vigésimo século, alguns autores têm proposto o ano de 1913 como o marco de sua restauração. Foi durante um acampamento em Los Angeles, na Califórnia, em 15 de abril de 1913, que um pregador canadense o Rev. R. E. Masclester, passou a ensinar que a verdadeira fórmula do batismo é em “nome de Jesus”. Sua mensagem foi recebida por uns e rejeitada por outros. Entre eles estava John. G. Sheppe, fundador de um movimento que ficou conhecido como “Só Jesus”, e o evangelista Frank Ewart. O unicismo chegou ao Brasil através do chileno Juan Bautista Álviar.
O batismo em nome de Jesus é a pedra fundamental do movimento unicista, seja em qual for a sua modalidade. Toda uma contra-argumentação é levantada em torno de Atos 2.38, tendo como objetivo legitimar sua crença. Em contrapartida, não existe uma única explicação para Atos 2.38, mas sim um conjunto de idéias e informações que unidas podem nos levar a um consenso. De maneira que não importa que tipo de argumento é usado para explicar o texto, desde que se compreenda que a distinção entre as pessoas da divindade era um fato resolvido entre os cristãos primitivos. Na busca por respostas, foram desenvolvidas as seguintes explicações:
- Mateus 28.19 não fazia parte do texto original;
- Atos 2.38 é uma variação textual;
- Não havia uma fórmula batismal definida;
- O texto grego de Atos 2.38 não fazia alusão ao batismo, mas uma confissão publica de pecados;
- O batismo em nome de Jesus foi destinado apenas aos judeus e prosélitos do judaísmo;
- Pedro não compreendeu o ensino de Jesus;
- Jesus empregou uma figura de linguagem;
- O uso do termo “nações”, que em grego é traduzido por “gentios”, sugere que o batismo em nome do Pai, Filho e Espírito Santo foi destinado especificamente aos gentios.
Embora não concordamos com tudo que é exposto no campo acadêmico, tais explicações são importantes no sentido que elas nos fornecem um leque muito grande de investigação. Mesmo supondo que Mateus 28.19 não fazia parte do texto original, e que o batismo em nome de Jesus era o único conhecido da igreja, seria isso suficiente para provar que a doutrina da trindade é antibiblica? O mesmo acontece com Marcos 16.9-20. Apesar de toda polêmica criada em torno dessa passagem, de ser ela ou não parte do texto original, nada influiria na grande comissão de Cristo. O ide de Jesus continuaria a ecoar pelos corredores da Igreja.
O que cria a Igreja Primitiva
A igreja primitiva não possuía um corpo definido de doutrinas, embora Atos 2.42 mencione a doutrina dos apóstolos. Na verdade, até meados do terceiro século da Era Cristã, praticamente nenhuma doutrina havia sido formulada. Não havia, por exemplo, uma fórmula definida para a benção apostólica, como vemos nas seguintes passagens:
"O meu amor seja com todos vós em Cristo Jesus. Amém." (I Cor.16.24)
"A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja, irmãos, com o nosso espírito! Amém. "(Ef. 6.24)
"A graça seja convosco. Amém." (Cl. 4.18).
Mais tarde, convencionou-se ministrar a benção apostólica baseada no modelo de 2 Corintios 13.13. Outras doutrinas foram estudadas e posteriormente organizadas em cremos. Os concílios foram de fundamental importância neste processo. O primeiro foi realizado em Jerusalém, por volta de 49 d.C., e discutiu a questão da circuncisão. A única passagem que parece apresentar uma forma de cremos, é Efésios 4.4.-6. Entretanto, somente apareceu 30 anos após a fundação da Igreja, e não abrangia todos os aspectos da fé cristã.
Embora a igreja primitiva não possuísse um conceito definido da doutrina da Trindade, ela certamente compreendia que existe uma distinção entre as pessoas da divindade. Tal distinção pode ser vista pela maneira como eles se referiam ao Filho, numa distinção clara com o Pai.
“A este Jesus Deus ressuscitou dos mortos, do que todos nós somos testemunhas”. (Atos 2.32) “Exaltado, pois, à destra de Deus, tendo recebido do Pai a promessa do Espírito Santo, derramou isto que vedes e ouvis”. (2.33)
“Esteja absolutamente certa, pois, toda a casa de Israel que a este Jesus, que vós o crucificastes, Deus o fez Senhor e Cristo”. (2.36)
“O Deus de Abraão, de Isaque e Jacó, o Deus de nossos pais, glorificou a seu servo Jesus”. (3.13)
“Tendo Deus ressuscitado ao seu servo, enviou-o primeiramente a nós...”.
(3.26)
“Levantaram-se os reis da Terra, e as autoridades ajuntaram-se à uma contra o Senhor e contra o seu ungido”. (4.26)
“Porque verdadeiramente se ajuntara, nesta cidade contra o teu santo servo Jesus, ao qual ungiste...”. (4.27)
“Enquanto estendes a mão para fazer curas, sinais e prodígios por intermédio do nome do teu santo servo Jesus”. (4.30)
“O Deus de nossos pais ressuscitou a Jesus, a quem vós matastes...”. (5.30)
“Deus, porém, com a sua destra, o exaltou a Príncipe e Salvador, a fim de conceder a Israel o arrependimento e a remissão de pecados”. (5.31)
“E logo pregava, nas sinagogas, a Jesus, afirmando que este é o Filho de Deus”. (9.20)
“Como Deus ungiu a Jesus de Nazaré com Espírito Santo e poder, o qual andou...”. (10.38)
“Esta é a palavra que Deus enviou aos filhos de Israel, anunciando-lhes o evangelho da paz, por meio de Jesus Cristo. Este é o Senhor de todos”. (10.39)
“Porquanto estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça, por meio de um varão que determinou e acreditou diante de todos, ressuscitando-o dentre os mortos”. (17.31).
As passagens citadas acima são suficientes para provar que Jesus, embora da mesma natureza do Pai, não são a mesma pessoa. Em momento algum Jesus é chamado de Pai, ou mesmo Espírito Santo. O unicismo argumenta que a distinção existente entre Pai e Filho era apenas de “papéis” ou “manifestações”; não havia, portanto, uma distinção de pessoas. O que não se entende com relação ao unicismo, é o porquê de todo este malabarismo divino. A descrição que eles fazem de Deus é, sem dúvida alguma, uma verdadeira encenação teatral. É justamente esse o conceito que se tem do Filho – a de um personagem usado temporariamente pelo Pai. Consequentemente, não haveria Filho de Deus como pessoa espiritual.
Batizados em nome de títulos?
Concordo plenamente que Pai, Filho e Espírito Santo são títulos e não nomes. No entanto, é importante frisar que o batismo não é “em nome de títulos”. Embora Pai, Filho e Espírito Santo possuam diversos nomes, o batismo não é administrado invocando cada um deles. Imagine a confusão que seria caso resolvêssemos pronunciar cada um dos nomes do Filho no batismo. E o que dizer do Pai e do Espírito Santo? Seria difícil, portanto, para uma igreja que começava a dar seus primeiros passos se ver presa a uma discussão interminável de nomes. Portanto, quando lemos “em nome do Pai”, deve ser entendido “na autoridade de” ou “na qualidade de”. O batismo é administrado na autoridade da pessoa do Pai, do Filho e do Espírito Santo, não importando quantos nomes cada um possa ter. Acresce o fato que essa era uma forma pública, senão culta, de expressão. Era comum em declarações públicas, ou em reuniões solenes, cuja ocasião requeria o uso de uma linguagem formar.
Mateus 10.42 é um bom exemplo do que estamos tentando provar. A expressão “em nome de discípulo” pode ser entendida de duas maneiras (a) “na autoridade de”; (b) “na qualidade de”. Obviamente, Jesus não tinha em mente uma expressão literal, como se discípulo fosse mesmo um nome. O mesmo acontece em Lucas 6.13, com a expressão “... a quem também deu o nome de apóstolos”. Seria apóstolo um nome? Jesus emprega uma figura de linguagem conhecida como metonímia – emprego de uma palavra por outra, baseando-se em uma relação constante entre as duas. Tal não se pode dizer de Marcos 16.18, uma vez que o nome de Jesus aparece nitidamente subtendido. Tratando-se de Mateus 28.19, a expressão mais correta seria “na autoridade de” querendo expressar a autoridade sua generis de cada uma das pessoas da divindade.
O uso do singular “em nome”
“Jesus deu a ordem: “batizando-os em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo”. Ele ordenou o batismo “em nome”. Por que ordenou Jesus o batismo “em nome”? Porque creram e guardaram sua palavra. Mateus certamente se manifestaria, caso Pedro tivesse desobedecido o senhor”. [2]
Não é preciso ser PHD em literatura para saber que o uso do singular “em nome” é uma expressão distributiva como no texto de Gêneses 48.16.
“O anjo que me livrou de todo mal abençoe estes rapazes, e seja chamado nele o meu nome, e o nome de meus pais Abraão e Isaque...”.
Não é porque a palavra “nome”, no singular, é usada para se referir a três pessoas diferentes (Abraão, Isaque e Jacó) que eles seriam a mesma pessoa, ou que teriam um mesmo nome. Trata-se apenas de uma expressão distributiva, muito comum na literatura hebraica e grega. Vejamos outro exemplo.
“E era o nome deste homem Elimeleque, e o de sua mulher Noemi, e os de seus dois filhos Malon e Quilion...”. (Rute 1.2)
Novamente encontramos uma expressão distributiva. A palavra “nome” é usada para se referir tanto a Elimeleque, como a sua mulher e seus dois filhos. Em textos refinados, como em Rute 1.2, o autor geralmente usa uma forma culta de escrita, obedecendo aos padrões ortográficos e gramaticais da língua em que escreve. O texto de Mateus 28.19 ficaria por de mais jocoso e com pouca fluidez caso o autor decidisse repetir a expressão “em nome” para cada uma das pessoas mencionadas. O mesmo aconteceria se alterássemos o sentido de Gêneses 48.16 e Rute 1.2.
Para fugir a tal argumento, David K. Bernard recorre a seguinte explicação:
“Para dirimir qualquer dúvida de que a distinção singular – plural seja significativa ou tenha sido deliberadamente planejada por Deus, precisamos, apenas, ler Gálatas 3.16, onde Paulo da ênfase ao significado do singular “teu descendente”, referindo-se a Gêneses 22.18”.
Seja qual for o significado teológico que Paulo empregou em Gálatas 3.16, o que nos compete é avaliar o uso do singular “posteridade”. Se as promessas que Paulo se refere são as mesmas de Gêneses 22.18, então temos que analisar seu contexto. Fica claro por uma leitura de Gêneses 22.17 que o singular “descendente” ou “semente” são expressões distributivas, como pelo uso das comparações “estrelas do céu” e “areia do mar”. Deus prometeu que abençoaria e multiplicaria a descendência de Abraão. É por meio de Jesus que somos filhos de Deus e herdeiros da promessa (Gálatas 3.22, 26, 29).
Onde estava Mateus?
“A julgar pela controvérsia sobre o modo bíblico correto do batismo nas águas, isto é, se deveríamos batizar segundo Mateus 28.19, ou segundo Atos 2.38, poderíamos pensar se Mateus fosse um indivíduo descuidoso, talvez não tão mentalmente alerto quanto os outros apóstolos, ou que talvez não estivesse presente no Dia de Pentecostes, quando Pedro declarou que o batismo nas águas deveria ser administrado em nome de Jesus Cristo para a remissão de pecados. Absolutamente nada foi mencionado no Dia de Pentecoste de um batismo em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo, e muito menos em qualquer outro lugar ou tempo, onde o batismo foi administrado. Por quê? Onde estava Mateus? Não defenderia ele seus escritos?” [3]
Tal questionamento se resume em um grave erro. O evangelho de Mateus não havia sido ainda escrito, quando Pedro e os demais apóstolos realizam o primeiro batismo em Jerusalém (Atos 2.38). Há, pelo menos, um espaço de trinta anos entre a fundação da Igreja (30 d.C) e a origem do Evangelho de Mateus, que somente apareceria em 60 d.C. Portanto, não somente Mateus, mas todos os que estiveram com Jesus após a ressurreição e receberam dele a grande comissão, poderiam igualmente se opor a declaração de Pedro. Mas parece que assim não aconteceu, como também não houve qualquer contestação ao repúdio de Pedro aos gentios, mesmo sabendo que o texto hebraico de Mateus 28.19 incluía principalmente eles.
Que a igreja primitiva possuía um conceito oposto ao unicismo, não resta nenhuma dúvida. Atos 2.38 é uma continuação ao que vinha sendo discutido desde o versículo 36. Fica evidente, portanto, que a compreensão que Pedro tinha do Filho, não era a de que Ele seria o Pai, ou mesmo o Espírito Santo. Tal não era a situação. Pedro, tanto quanto os demais apóstolos da igreja primitiva, insistiam em reconhecer Jesus como Filho de Deus, e não como Espírito Santo.
Uma parábola?
Na ausência de argumentos que comprove sua doutrina, os unicistas desqualificam Mateus 28.19 ao comparar aquela passagem como uma das “parábolas de Jesus”.
“Os evangelhos, Mateus, Marcos, Lucas e João registram o ministério de Jesus. Ele falou muitas vezes em parábolas, alegorias ou histórias simples, usando ilustrações que eles podiam entender. Ele usou termos como Pai, Filho e Espírito Santo. Mas, no dia de pentecostes todos, inclusive Mateus, entenderam que Jesus Cristo encerrava em si mesmo todo o mistério da Divindade. Portanto, batizaram em seu nome, o nome maravilhoso, Senhor Jesus”. [4]
Semelhante interpretação somente vem comprovar qual é o grau de comprometimento que os unicistas têm com as Escrituras. Não que existisse nada de errado com as parábolas, que eram um instrumentos pedagógicos, mas o fato de associar uma passagem a um modelo secreto de ensino contraria o que chamamos de “Hermenêutica Bíblica”. Os unicistas, ao que parece, não possuem qualquer noção dessa matéria. Uma parábola, segundo o modelo revelado por Jesus, são histórias tiradas da vida diária para descrever e ilustrar certas verdades espirituais. Sua singularidade consiste em revelar a verdade aos espirituais e, ao mesmo tempo, ocultá-la dos incrédulos (Mateus 13.11). As parábolas geralmente eram proferidas para um público maior que doze discípulos, e não mencionavam nomes. Se Mateus 28.19 fosse mesmo uma parábola, todo o contexto anterior e posterior ao versículo também fariam parte do mesmo ensino. Numa parábola são usadas palavras chaves como “semelhante”, “eis que” e “assim como”. Entretanto, a linguagem usada por Jesus em Mateus 28.16-20, não possui nada semelhante a uma parábola.
O que o unicismo sugere com relação a Mateus 28.19 é, sem dúvida alguma, uma verdadeira fórmula mágica. Por que ordenaria Jesus que fossemos batizados em nome do Pai, Filho e Espírito Santo, uma vez que seriam um mesmo nome? Não deveria ordenar que fossemos batizados em seu nome? Por que não o fez? Poderia uma pessoa, sem qualquer noção de unicismo, concluir com base em Atos 2.38, que Pai, Filho e Espírito Santo seriam uma mesma pessoa? Existem mais evidências em torno de Mateus 28.19 do que para Atos 2.38, onde se supõe admitir uma nova fórmula batismal.
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Batismos em Atos
Das oito referências a batismos em Atos, cinco mencionam o nome de Jesus e três não fazem menção a nenhuma das pessoas divinas. A omissão que se tem nos casos de Atos 8.37 e 16.15,33 não é apenas ocasional, como também serve de exemplo para os demais casos de 2.38; 8.12,16; 10.48; 19.5 e 22.16. Se além dessas três referências a batismos em Atos não houvesse nenhuma outra, a interpretação inicial seria que a igreja primitiva não possuía nenhuma fórmula batismal. O problema com esse tipo de interpretação é que ela sugere uma visão absoluta, total ou única do texto. Da mesma maneira devemos pensar com relação às passagens que fazem menção especial ao nome de Jesus: significa isso que a igreja primitiva batizava apenas em nome de Jesus? É algo para se pensar.
Seria Atos 2.38 uma variação textual?
Existem bons motivos para acreditar que sim. A Critica Textual trabalha a partir de duas evidências (a) Interna. Neste campo de pesquisa, são considerados o contexto, o estilo de escrita, o testemunho e a coerência do texto; b) Externa. Para dar credibilidade ao estudo do texto, seja para provar determinado ponto de vista ou rechaçar variações textuais, são considerados além do contexto bíblico os manuscritos antigos e o testemunho dos Pais da Igreja. A única conclusão que podemos chegar, após uma análise minuciosa do Novo Testamento, era que o novo convertido, no ato do batismo, confessava publicamente seus pecados e em seguida rogava a Jesus por perdão. Tal fato baseia-se nas seguintes evidências.
a) A fórmula batismal foi dada por Jesus pouco antes de sua ascensão aos céus e descida do Espírito Santo. Dificilmente Pedro poderia ter errado ou desenvolvido uma nova concepção do batismo.
b) Os cristãos primitivos acreditavam piamente que Jesus era o Filho de Deus, e que o Pai era uma pessoa distinta juntamente com o Espírito Santo.
c) A salvação não se dá por meio do batismo, mas por uma confissão sincera de pecados. É por meio do sangue de Jesus que somos purificados.
d) Não é necessário ser batizado em água para receber o Espírito Santo, como prova Atos 10. 45-47.
e) Atos 22.16 não diz que Paulo foi batizado em nome de Jesus, mas que ele deveria invocar o nome do Senhor. Se essa passagem refere-se mesmo ao batismo em nome de Jesus, por que deveria Paulo (e não Ananias) invocar o nome do Senhor? A lógica propõe que é o batizador, e não o batizado, que deve pronunciar a fórmula batismal. Paulo não poderia ter sido batizado em nome de Jesus, porque então não seria um batismo. Ananias foi enfático ao dizer: “Levanta-te, recebe o batismo, e leva os teus pecados invocando o nome do Senhor”. Quem deveria invocar o nome do Senhor? Os pecados são purificados pelo sangue de Cristo ou pelas águas batismais? Que relação teria o batismo de Saulo com os demais mencionados em Atos?
Uma confissão pública de pecados
Embora diferente do batismo de João, a confissão de pecados era uma prática seguida pela igreja primitiva. “E muitos dos que haviam crido vinham, confessando e publicando seus feitos” (Atos 19.17,18). Uma vez feita à confissão de pecados, os candidatos deveriam expressar sua fé no Filho de Deus. Esse era um requisito básico e fundamental de toda a ritualística batismal. Vejamos alguns exemplos em Atos.
“E disse Felipe: É licito, se crês de todo coração. E, respondendo ele, disse: creio que Jesus é o Filho de Deus” (Atos 8.37).
“E lhes disseram: crê no Senhor Jesus Cristo e será salvo, tu e a tua casa” (Atos 16.31).
“E Crispo, principal da sinagoga, creu no Senhor com toda a sua casa; e muitos dos corintios ouvindo-o, creram e foram batizados” (Atos 18.8).
Observe que em cada referência a batismos em Atos, temos uma confissão de fé. Somente os que creem em Jesus e no seu sacrifício vicário podem alcançar a salvação. O ponto chave de nossa argumentação está em Atos 10.43. “A este dão testemunho todos os profetas, de que todos os que nele crêem receberão o perdão de pecados pelo seu nome”. Essa passagem é a que mais está de acordo com Lucas 24,47. Como parte de sua hermenêutica falha, os unicistas veem essa passagem como uma referência ao batismo. É o que eles chamam de “regeneração batismal”, ou seja, o batismo é uma condição para se obter o perdão de pecados e herdar a vida eterna. Na instrução inicial pré-batismo, publicada pelo pastor Francisco F. Santos Filho, encontramos:
“Por que o batismo tradicional não tem valor bíblico? Porque o tal batismo não invoca o nome de Jesus, e se o nome de Jesus é omitido, não é para perdão de pecados”. [5]
Esse é um erro sério, uma vez que o batismo não é realizado para perdão e remissão de pecados; o batismo apenas figura como algo que já aconteceu na vida do salvo. A salvação, desse modo, não está condicionada ao batismo. William Marion Branham, fundador da Igreja Tabernáculo da Fé, apesar de sua oposição acerba ao trinitarismo, parece concordar.
“Alguns de vocês da unicidade batizam equivocadamente. Vocês batizam para a regeneração como se o fato de imerso na água, salvasse. Regeneração não vem por meio da água; é uma obra do Espírito. O homem que inspirado pelo Espírito Santo deu o mandamento: Arrependei-vos e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus...”, não disse que a água regenerava”.
Lucas 24.47 não pressupõe qualquer formula batismal, mas é uma reafirmação de Atos 10.43. De maneira que o nome de Jesus está intimamente associado ao perdão de pecados. É a partir daí que entendemos que as diversas referências em Atos, como 2.38; 8.12,16; 10.48; 19.5 e 22.16, somente podem significar uma confissão continua de pecados, no ato do batismo. O nome de Jesus, então, era invocado sobre cada um deles, concedendo-lhes perdão.
Atos 22.16 não significa que Paulo teria se auto-batizado, mas que ele exerceu sua fé no Senhor, rogando-lhe pelo perdão de seus pecados. É o que podemos entender da expressão: “... lava teus pecados invocando o nome do Senhor”. Embora não apareça nas demais passagens em Atos, uma única evidência torna clara toda uma compreensão. Atos 22.16 somente pode significar uma “confissão pública de pecados”, no ato do batismo, após sendo administrado o batismo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
Quem não honra o Filho não honra o Pai
As passagens que fazem referência especial ao nome de Jesus em Atos, certamente ocorrem como cumprimento ao que temos em João 5.23.
“Para que todos honrem o Filho, como honram o Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que o enviou”.
Embora João escreveu seu evangelho para os fiéis em geral, algumas partes de seu livro foram escritas para um grupo especifico de judeus; são os que perseguiam Jesus e rejeitavam sua doutrina. Eles não aceitavam que Jesus, um galileu de família pobre e semianalfabeta exercesse influência entre o povo. Para eles Jesus não era Deus, mas sim um falso profeta.
Essa mesma perseguição continuou anos depois de sua ressurreição, sendo refletida em alguns momentos da igreja primitiva, quando os principais dos sacerdotes tentaram impedir o seu avanço, colocando uma série de barreiras aos discípulos de Jesus. “Mas, para que não se divulgue mais entre o povo, ameacemo-lhes para que não falem nesse nome a homem algum. E, chamado-lhes, disseram-lhes que absolutamente não falassem, nem ensinassem, no nome de Jesus” (Atos 4.17,18). A reação dos apóstolos foi a mais definitiva possível: “Porque não podemos deixar de falar o que temos visto e ouvido” (Atos 4.20). Tal postura resultou numa severa perseguição aos discípulos de Jesus. Assim, tornou-se necessário uma melhor ênfase ao nome de Jesus; nada melhor que usar seu nome como uma referência especial ao batismo. Não que as pessoas do Pai e do Espírito Santo deveriam ser omitidas, mas para que houvesse uma melhor ênfase ao nome de Jesus. Cada discípulo, ao se batizar, deveria expressar publicamente sua fé no Filho de Deus.
Bruce L. Shelley, em seu pequeno livreto “Porque Devo me Batizar", declara:
“Nos primeiros anos do cristianismo, quando as autoridades romanas geralmente consideravam a igreja como um movimento subversivo e contrário ao tradicional estilo de vida romano, os juramentos à pátria eram cruciais. Lá pelos meados do terceiro século, o imperador Décio tentou suprimir o cristianismo impondo um teste de lealdade a cada pessoa de seu império. Os cidadãos e escravos tinham de obter certificados indicando que haviam oferecido sacrifícios ou queimado incenso para os deuses romanos. Recusar praticar este ato poderia significar pena de morte”.
Sem sombra de dúvidas, o alvo dessa perseguição eram os seguidores de Jesus. Décio sabia que os cristãos, em seu batismo, confessavam que Jesus é senhor. E ele havia determinado que eles deveriam dizer: César é senhor, ou sofrer as consequências”. [6]
Pelo testemunho de Shelley, fica mais que comprovado que os cristãos primitivos jamais batizaram alguém apenas “em nome de Jesus”. Ao contrário, cada candidato ao batismo deveria reconhecer Jesus como Senhor. Uma vez feita à confissão de fé, os candidatos eram batizados seguindo o modelo de Mateus 28.19. O batismo somente é completo quando ministrado em nome do Pai, Filho e Espírito Santo. Ele tem seu fundamento no batismo de Cristo, quando as três pessoas aparecem juntas.
Se o trinitarismo não era “senão uma doutrina no futuro”, o mesmo poderia se dizer do unicismo. A doutrina da Trindade, conquanto tenha sido oficialmente organizada a partir do segundo século, teve sua base nos ensinos de Jesus e dos apóstolos. O mesmo não acontece com o unicismo
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O testemunho dos Pais da Igreja
O texto a seguir é uma reprodução do comentário do professor Raimundo de Oliveira sobre o batismo em nome de Jesus.
"Os mais piedosos lideres da Igreja antiga provam que os apóstolos e pastores daqueles tempos batizavam em nome das três pessoas da Trindade, e não no nome de Jesus apenas. Um livro muito antigo, chamado “Os Ensinos dos Doze Apóstolos”, diz: “Agora, concernente ao batismo, batizai desta maneira: depois de ensinar todas estas coisas, batizai em nome do Pai, Filho e Espírito Santo... O batismo deve ser efetuado conforme ordenou o Senhor, dizendo: Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo...”
Justino Mártir, no ano 165 de nossa Era, escreveu: “São levados [falando dos novos convertidos] a um lugar onde haja água, e recebem de nós o batismo em nome do Pai, Senhor de todo o universo, e do nosso Senhor Jesus Cristo, e do Espírito Santo”.
Tertuliano, Clemente de Alexandria e Basílio, nos idos de 156, 160 e 326, respectivamente, disseram: “Ninguém seja enganado nem se suponha que, pelo fato de os apóstolos frequentemente omitirem o nome do Pai e do Espírito Santo, ao fazerem menção do batismo [não na fórmula quando estão batizando] que por isso não seja importante invocar estes nomes”.
Cipriano, no ano 200, falando de Atos 2.38, disse: “Pedro menciona aqui o nome de Jesus Cristo, não para omitir o do Pai, mas para que o Filho não deixe de ser unido com o Pai. Finalmente, depois de ressurreto, os apóstolos são enviados em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo”.
Calvino, no ano de 1550, em seu comentário sobre 1 Corintios 1.13, diz: -“Que é ser batizado em nome de Cristo? Respondo que por esta frase entende-se que o batismo estriba-se n autoridade de Cristo, dependendo de sua influência e, em certo sentido, consiste em invocar ou estar em seu nome”. [7]
Referências Bibliográficas
1. A Unicidade de Deus, David K. Bernard, pp. 129 – 132, Casa Publicadora Pentecostal, Alvorada, Rio Grande do Sul.
2. Porque nós batizamos em nome de Jesus, panfleto explicativo, CPP.
3. Onde estava Mateus, panfleto explicativo, CPP.
4. Ibidem.
5. Instrução inicial pré-batismo, Francisco F. Santos Filho, Rio de Janeiro, 1992.
6. Porque devo me batizar, pp. 6 -7, CPAD.
7. Seitas e Heresias, Raimundo F. de Oliveira, pp. 156-157, CPAD.
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